segunda-feira, 7 de novembro de 2022

AVE XANDÃO, O DONO DO BRASIL

Alexandre de Moraes: o presidente do TSE acusado de 'ditador' por Bolsonaro que já foi alvo do PT

Alvo de bolsonaristas, Moraes, atual presidente do TSE, vem sendo taxado de autoritário por bolsonaristas

É muito pouco provável que no Brasil de hoje haja quem nunca tenha ouvido falar de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e atualmente presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Em eleições fortemente polarizadas como nunca antes vistas na história do país, o paulistano Moraes, de 53 anos, tornou-se alvo principalmente dos apoiadores do atual presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição — eles criticam fortemente as decisões do magistrado e o acusam de favorecer o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O próprio Bolsonaro já chamou Moraes de "patife", "moleque", "canalha", "vagabundo" e "ditador".

O mais recente capítulo dessa polêmica envolveu uma acusação do ministro das Comunicações, Fabio Faria, de que Bolsonaro teve 154 mil inserções de rádio a menos que Lula, a maioria das quais na Bahia, Estado que deu vitória ao petista. Moraes deu um prazo de 24 horas, terminado nesta quarta-feira, para mostrar provas dessa suposta fraude. O ministro acabou negando a ação da campanha de Bolsonaro.

Segundo Moraes, a ação de Bolsonaro não tem provas e se baseia em levantamento de empresa "não especializada em auditoria". Também apontou possível "cometimento de crime eleitoral com a finalidade de tumultuar o segundo turno do pleito em sua última semana" e mandou o caso para ser avaliado dentro do inquérito das "milícias digitais", do qual ele mesmo é relator no STF.

Encaminhou ainda a decisão à Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) e ao corregedor-geral do TSE. "Para instauração de procedimento administrativo e apuração de responsabilidade, em eventual desvio de finalidade na utilização de recursos do fundo partidário dos autores."

Bolsonaro, por sua vez, prometeu recorrer até o fim e disse que seu partido deve contratar uma terceira empresa de consultoria para analisar os casos.

"Com toda a certeza, nosso jurídico deve entrar com recurso, já que foi para o Supremo Tribunal Federal. Da nossa parte, iremos às últimas consequências, dentro das quatro linhas da Constituição, para fazer valer aquilo que as nossas auditorias constataram, que há realmente um enorme desequilíbrio no tocante às inserções. Isso obviamente interfere na quantidade de votos no final da linha", afirmou Bolsonaro.

O presidente também convocou ministros e os três comandantes de Forças Armadas para uma reunião no Palácio da Alvorada antes de se pronunciar. Saiu sem responder a perguntas de jornalistas.

Nas redes sociais, grupos bolsonaristas reforçaram o argumento de fraude eleitoral e pediram o impeachment de Moraes.

Mas, embora o ministro tenha se tornado hoje o principal alvo da militância bolsonarista, o próprio PT já chamou o magistrado de "despreparado" e "parcial", quando ele foi empossado como ministro do STF, em 2017 (ler abaixo).

atuação do MP", escreveu Bolsonaro no Twitter.

Isso se deve ao fato de que, quando Moraes acolheu pedido da Polícia Federal (PF) para prender o ex-deputado, sua decisão prescindiu da manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo ele, porque o MP não havia se pronunciado sobre o pedido dentro do prazo.

Eleições: ex-ministro do STF diz temer 'tempestades' com Moraes no comando do TSE
Na ocasião, a PGR negou a afirmação de Moraes e, em nota, o procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou que "houve, sim manifestação da PGR, no tempo oportuno" e que "em respeito ao sigilo legal, não serão disponibilizados detalhes do parecer, que foi contrário à medida cautelar".

Aras também descreveu a prisão de Jefferson como "uma censura prévia à liberdade de expressão".

"O entendimento da PGR é que a prisão representaria uma censura prévia à liberdade de expressão, o que é vedado pela Constituição Federal", acrescentou Aras no comunicado.

Outra decisão de Moraes que repercutiu negativamente entre bolsonaristas foi a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), em março deste ano, motivada por vídeo divulgado pelo parlamentar.

Na decisão, o ministro do STJ afirmou ser "imprescindíveis medidas enérgicas para impedir a perpetuação da atuação criminosa de parlamentar visando lesar ou expor a perigo de lesão a independência dos Poderes instituídos e ao Estado Democrático de Direito".

Naquela ocasião, também destacou que a Constituição não permite a propagação de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático nem tampouco a realização de manifestações nas redes sociais visando o rompimento do Estado de Direito.

Bolsonaristas, contudo, afirmaram se tratar de 'censura' e cerceamento da liberdade de expressão.
Vale lembrar que, mais recentemente, Moraes deu nova decisão favorável a Bolsonaro, ao determinar a remoção dos vídeos divulgados pela campanha de Lula reproduzindo falas do atual presidente sobre meninas venezuelanas.

No trecho da entrevista reproduzido pela campanha de Lula , Bolsonaro aparece dizendo que, durante um passeio de moto pela comunidade de São Sebastião, nas proximidades de Brasília, avistou meninas de 14 e 15 anos e que "pintou um clima" .

Na decisão, o principal argumento de Moraes foi a proteção à liberdade de expressão.

Segundo o ministro, a liberdade de expressão não representa um salvo-conduto para a propagação de discursos "sabidamente inverídicos", "agressivos" e "preconceituosos".

"Liberdade de expressão não é Liberdade de agressão! Liberdade de expressão não é Liberdade de destruição da Democracia, das Instituições e da dignidade e honra alheias. Liberdade de expressão não é Liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e preconceituosos!", diz trecho da decisão de Moraes

Nesta semana, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) voltou a pedir o impeachment de Moraes por "reiterados abusos expressos em crimes de responsabilidade".

Crítica do PT
Embora hoje tenha sua imagem associada ao PT e à esquerda por apoiadores de Bolsonaro, a nomeação de Moraes ao STF, em março de 2017, foi duramente criticada pela Executiva do partido, que a descreveu como "um profundo desrespeito à consciência jurídica do país".

Segundo a nota publicada na ocasião, a CEN PT (Comissão Executiva Nacional do PT) afirmou que "a nomeação e a trajetória de Moraes, então ministro da Justiça do governo ilegítimo tornaram evidente seu despreparo, seu desprezo pelas instituições e sua parcialidade".

Natural da cidade de São Paulo, Moraes nasceu no dia 13 de dezembro de 1968. Ele foi nomeado para o Supremo pelo ex-presidente Michel Temer após a morte do ministro Teori Zavascki em um acidente aéreo. Zavascki havia sido indicado pela ex-presidente Dilma Rousseff em 2012 para o lugar de Cezar Peluso, que se aposentara ao atingir a idade limite, então de 70 anos. Na ocasião, o Senado aprovou a indicação de Moraes por 55 votos a favor e 13 contra. Aos 48 anos, ele passou, então, a integrar a corte.

Moraes era, na época, ministro da Justiça de Temer. Ele chegou ao Supremo com apoio do PSDB e era tido como um perfil mais conservador para a corte. Na época, se manifestou, por exemplo, contra a legalização do aborto e da eutanásia, por considerar que essas práticas violavam o direito à vida. Também se posicionou contra a redução da maioridade penal, mas defendeu punições mais duras para menores de 18 anos em caso de crimes graves.

O desejo de Moraes de integrar o STF era notório no meio jurídico, mas parecia improvável no curto prazo, já que em 2015 o Congresso elevou a idade máxima para aposentadoria compulsória dos ministros de 70 para 75 anos.

Enquanto o sonho estava em suspenso, falava-se nos bastidores de Brasília que seu desejo seria concorrer ao governo de São Paulo pelo PSDB em 2018.

Em meio à grave crise política pela qual passava o país, sob o impacto da operação Lava Jato, sua indicação foi alvo de críticas por sua suposta falta de imparcialidade. Para os opositores da sua nomeação, Moraes foi indicado ao Supremo para barrar as investigações contra membros do governo Temer e sua base no Congresso.

Moraes negou veementemente essas acusações nas quase 11 horas de sabatina com senadores e destacou não ser o primeiro indicado ao STF com histórico de atividade política. Na ocasião, salientou também que os coordenadores da Lava Jato elogiaram sua indicação publicamente.

Em sua fala inicial, chegou a dizer que atuaria no Supremo "com imparcialidade, coragem, dedicação e sincero amor à causa pública".

Depois, ao responder pergunta sobre sua tese de doutorado, em que defende que presidentes não deveriam poder indicar integrantes do governo para a Corte, prometeu: "Jamais atuarei entendendo que minha indicação ou eventual aprovação por vossas excelências tenha qualquer ligação de agradecimento ou favor político", afirmou.

No dia seguinte, ele negou que tivesse adiantando ações da Polícia Federal — alegou que a afirmação ocorreu porque houve operações desde que ele havia assumido o cargo de ministro da Justiça.

Jurista experiente
Além da vida política que o projetou nacionalmente, Moraes é um jurista experiente, reconhecido no meio acadêmico.

Formado em 1990 pela prestigiada Faculdade de Direito da USP, Alexandre de Moraes obteve o título de livre-docente em direito constitucional na mesma universidade 11 anos depois.

Além de dar aulas na mesma USP e na Universidade Mackenzie, escreveu diversos livros jurídicos que se tornaram referência em direito constitucional, direitos humanos, agências reguladoras e legislação penal especial.

Apesar do sucesso como autor, enfrentou desgaste diante das acusações de plágio em suas obras.

Em 13 de maio de 2004, ganhou a honraria mais alta do Tribunal de Justiça de São Paulo, o Colar do Mérito. Foi o jurista mais jovem a receber a homenagem, aos 35 anos.

Atuou também como advogado. Em 2014, defendeu o ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB), preso pela Lava Jato, de uma acusação de uso de documento falso — ele acabou absolvido.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63386608

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